“O que queres ser quando fores grande?” Desde cedo que recebemos esta pergunta de pais, professores, avós. Na maior parte das vezes o sonho de ser bombeiro, polícia, cabeleireira, astronauta, fica pelo caminho. No caso de Paula Jorge, geneticista laboratorial clínica do Centro Hospitalar e Universitário de Santo António - Centro de Genética Médica, docente e investigadora na Universidade do Porto, o sonho concretizou-se: “Ser cientista foi a primeira profissão que imaginei. Sempre gostei de experimentar, discutir, ter ideias e de as testar e de sonhar”, diz. E foi por aí que seguiram os seus estudos.

Paula Jorge é licenciada em Bioquímica pela Universidade do Porto e doutorou-se em 2001, na mesma instituição, em Ciências Biomédicas. A sua especialidade é em genética humana, e foi depois de terminar o doutoramento que intensificou o seu trabalho de investigação, embora não se dedique a ele exclusivamente. O caminho começou, refere, muito graças a “professoras e professores fascinantes que lecionavam expondo os resultados da sua investigação”, com os quais contactou em todo o seu percurso académico.

A investigadora não só soube, desde cedo, que queria enveredar pela ciência, como sabia qual a área a escolher: a genética humana. “Ainda muito jovem solicitava aos meus pais que me levassem a visitar familiares menos chegados para recolher informação para perceber os parentescos e, assim, construir a nossa árvore familiar”, conta. Na sua opinião, a genética é das áreas que mais tem evoluído em termos tecnológicos, sendo também a área que “permite dar respostas concretas”, refere. Assim, a hereditariedade e a genética sempre foram áreas que lhe suscitaram bastante curiosidade e interesse, e isso tem sido o seu dia-a-dia desde então.

Mais recentemente, Paula Jorge tem trabalhos desenvolvidos na área da fertilidade feminina. O seu grupo está a tentar “identificar as causas genéticas e compreender os detalhes mecanísticos das vias envolvias na função/competência do ovário e, assim, contribuir para a compreensão da infertilidade”. Em 2019 o trabalho foi alvo de um pedido de patente em Portugal, concedido em 2022. E é na fertilidade feminina que reside um dos seus grandes sonhos enquanto profissional. A cientista ambiciona que, com esta investigação inovadora, seja possível “identificar um biomarcador de infertilidade que permita um tratamento com real impacto na saúde não só no presente como para as gerações futuras”, diz.

Depois da proteção do trabalho via patente, o objetivo final é a comercialização. Apesar de ainda estar longe de ser possível, a equipa continua a trabalhar, estando neste momento focada em “testar o modelo matemático desenvolvido em amostras de outros grupos e cujos resultados já foram publicados, uma vez que existe sempre a limitação do número de amostras tendo em conta a realidade do nosso país”, explica. O manuscrito que descreve estes resultados já foi submetido e o passo seguinte é trabalhar as amostras, “incorporando outras dimensões metabólicas e genéticas, testando a aplicabilidade clínica”. A par disso, a equipa quer também criar um plano de gestão de dados para maximizar a sua interoperabilidade, o que permitirá, pelas palavras de Paula Jorge, “uma maior utilização da informação gerada por este estudo pela comunidade de investigação em fertilidade feminina”.

U.Porto: um lugar aberto, multidisciplinar e que reconhece o mérito dos investigadores

As “casas” onde é possível trabalhar nestes objetivos de carreira são duas: por um lado o Centro Hospitalar e Universitário de Santo António, onde desenvolve a maior parte do seu trabalho, por outro a Universidade do Porto, mais particularmente o Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, onde dá aulas. Paula Jorge vê na interligação destes dois mundos um lugar aberto que permite colaborações internacionais, reconhecendo o mérito dos investigadores: “a internacionalização é fulcral para os nossos estudantes e investigadores”, refere. Além disso, salienta também a possibilidade de se desenvolver investigação multicêntrica e multidisciplinar entre equipas com elementos de diferentes áreas de especialização e com apoio a vários níveis como uma grande mais valia da instituição.

Ser investigadora é ter braços para mais do que uma coisa em simultâneo, mesmo que o tempo não estique e às vezes seja difícil arregaçar as mangas para atingir todos os objetivos. A par do trabalho mais hands-on, digamos assim, Paula Jorge trabalha também em permanência para “melhorar o diagnóstico e promover a reflexão sobre a infertilidade feminina”, diz. Assim, o seu percurso profissional contribui regularmente para dois Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas: Objetivo 3 - Garantir o acesso à saúde de qualidade e promover o bem-estar para todos, em todas as idades e o Objetivo 5: Alcançar a igualdade de género e empoderar todas as mulheres e raparigas.

Como refere Paula Jorge, a genética humana tem a grande vantagem de permitir “trabalhar para as pessoas”, não necessariamente, nem apenas, doentes ou amostras. E é esse caminho que tem vindo a trilhar, com os olhos postos num futuro mais inovador, igualitário e consciente.