Estima-se que pelo menos 50 milhões de casais em todo o mundo sofram ou venham a sofrer de algum tipo de problema de fertilidade, segundo dados da Organização Mundial de Saúde. Como consequência, a procura por técnicas de procriação medicamente assistida tem aumentado, mas a taxa de sucesso está longe de ser a desejável.
Na Universidade do Porto existe um grupo de investigação empenhado em mudar esta realidade, trazendo uma nova esperança a pessoas com este tipo de condição. E a solução passa por melhorar o modo de preservação dos espermatozoides, através de uma nova utilização de um composto, descoberta no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) pela mente de cinco cientistas.
Durante um tratamento de fertilidade, existe sempre uma parte do processo em que são recolhidos espermatozoides, que serão depois preservados a 37ºC. Ao fim de um certo tempo, é natural que eles comecem a perder características essenciais para o sucesso da fertilização (tais como mobilidade, por exemplo), e isso faz com que a taxa de sucesso do tratamento comece a baixar. E se fosse possível armazena-los de forma a que a qualidade e viabilidade se mantivesse intacta?
Marco Alves, do ICBAS, é o investigador responsável pelo grupo de cientistas por trás desta invenção, e desde cedo na sua carreira se interessou pelo controlo da fisiologia do espermatozoide. As teorias sobre o que se poderia fazer eram várias – algumas caíram por terra – mas o caminho “moroso, ponderado e difícil” acabou por levar a investigação a bom porto e à solução efetiva de um problema real. “As soluções de preservação de espermatozoides que existem atualmente no mercado não são ainda eficazes ao ponto de os manter viáveis e funcionais por períodos prolongados”, explica Marco Alves. Começava a desenhar-se na sua cabeça uma maneira de complementar essas técnicas, melhorando os resultados dos tratamentos.
“O nosso composto serve de suplemento às soluções já existentes e permite uma melhoria acentuada da qualidade dos espermatozoides durante e depois da preservação”, explicam os investigadores. Até à data já foram feitos testes e os mesmos demonstraram que com esta descoberta científica é possível manter as gâmetas a 37 graus sem que elas percam motilidade e sem que ocorram danos oxidativos ao nível do DNA. Para além disso, refere Marco Alves, “a capacidade de fertilização dos espermatozoides manteve-se intacta”.
As vantagens desta descoberta feita na Universidade do Porto são inequívocas, salientando-se o novo alento para quem deseja um filho e, por algum motivo físico, não consegue. “Um casal nesta situação passa por muito mais do que tratamentos clínicos: existe sofrimento psicológico e ansiedade”, ressalva Marco Alves. O que se pretende aqui é possibilitar um tratamento rápido, eficaz e que cause o menor stress possível: “E o avanço que a nossa investigação trouxe pode aumentar o tempo para a janela de tratamento ou até mesmo possibilitar o acesso a gâmetas viáveis durante mais tempo”, diz o investigador.
O grupo é constituído por Marco Alves pelo Prof. Doutor Pedro Fontes Oliveira, pelo Prof. Doutor Mário Sousa e pelos estudantes de doutoramento Tito Teles de Jesus e Susana Pinto de Almeida. Atualmente, estão a tentar uma parceria com a indústria, tendo sido já contactados por uma grande farmacêutica. O objetivo final é levar a descoberta mais além, demonstrando o seu potencial de aplicação. “Recorrendo ao composto é possível por exemplo, tentar desenvolver um contracetivo masculino ou tratar homens com problemas de mobilidade de espermatozoides, a chamada astenozoospermia”, conta Marco Alves.
A invenção tem sido acompanhada desde o início pela U.Porto Inovação, e existe já um pedido provisório de patente. Na opinião dos investigadores, a intervenção do gabinete foi, desde sempre, “feita com muito profissionalismo, tornando tudo menos penoso do que se pensava no início”, refere Marco Alves. Apesar de um processo de investigação que classifica como difícil, o grupo está muito otimista quando põe os olhos no futuro: “Já produzimos resultados que nos dão segurança e são suficientes para demonstrar que o que nós fazemos suplementa os meios comerciais e mantém os espermatozoides com melhor qualidade”, conclui.