De origens que descreve como “muito humildes”, Marco Alves cresceu como uma criança muito curiosa e boa aluna. A vontade de ajudar e contribuir para a sociedade sempre esteve lá, mas, confessa, não sabia como o fazer pois nunca pensou sequer em conseguir “terminar uma licenciatura”. A verdade é que não só a terminou como ingressou, depois, num doutoramento e num pós-doutoramento e é, hoje em dia, um dos investigadores mais conceituados na área da fertilidade.

 “Sempre tive a certeza que quando se trabalha muito, e bem, podemos ser bons em qualquer área”, refere Marco Alves, que teve o primeiro contacto com a Universidade do Porto em 2005, mais precisamente como estagiário no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS), de onde saiu para prosseguir o seu percurso académico. Voltou ao ICBAS em 2016, já como investigador auxiliar e com alunos de doutoramento e projetos financiados a seu cargo: “Vinha com perspetivas de, finalmente, construir uma equipa.”, diz.

A escolha da fertilidade – área onde trabalha atualmente – não foi obra do destino mas quase, uma vez que o investigador admite não planear demasiado o futuro: “Acredito que as coisas acontecem quando e porque têm de acontecer”. Apesar de o seu doutoramento ser na área da bioenergética, a curiosidade pela área da fertilidade acabou por levar a melhor, particularmente no que se referia ao sexo masculino onde, na sua opinião, existia “um deficit de investigação básica e poucos investigadores a trabalhar a área”. Assim, arregaçando as mangas e colocando mãos à obra, Marco Alves começou a pensar em projetos: “Arrisquei sem medos, confiando na minha capacidade de trabalho. O resto foi acontecendo. Não seria capaz de ensinar sem contribuir para o desenvolvimento do conhecimento.”, conta.

"Finalmente começamos a pensar em fertilidade como algo muito mais complexo que o ato de gerar um filho"

Nem tudo é simples como seguir uma paixão, no entanto. Na opinião do investigador, a área da fertilidade masculina não tem verbas nem gente suficiente pelo simples motivo de “não ser mediática”. Quando questionado sobre o seu maior sonho atual na área da fertilidade Marco Alves diz ambicionar ser possível “recriar todo o processo sequencial de produzir espermatozoides in vitro (a espermatogénese) ou ainda desenvolver um método que permitisse escolher “o melhor” espermatozoide e com isso evitar a transmissão de informação deletéria para os filhos”.

O investigador tem consciência, no entanto, que existe ainda um longo caminho a percorrer e que a fertilidade e a qualidade do evento reprodutivo estão a entrar devagar na agenda política dos stakeholders. Apesar das enormes possibilidades nas técnicas de procriação medicamente assistida, é necessário muito trabalho e interesse, além de, claro, financiamento para se conseguirem alcançar bons resultados. Além disso, é fundamental que se continue a pensar no processo reprodutivo e na fertilidade como “algo muito mais complexo que o ato de gerar um filho”, refere.

Proteger e valorizar o conhecimento

Foi com a U.Porto Inovação que Marco Alves começou a inteirar-se melhor da necessidade de patentear as suas descobertas no sentido de proteger e, depois, valorizar o conhecimento. “É difícil para um investigador já estabelecido começar a olhar para o conhecimento produzido como uma possibilidade de valor acrescentado para o desenvolvimento de produtos”, confessa. No entanto, o investigador elogia a estrutura da Universidade do Porto que presta apoio nesse sentido, que conta com “pessoas compreensivas e pacientes, que conseguem adaptar-se às necessidades dos investigadores”.

Marco Alves tem, neste momento duas comunicações de invenção com pedidos de patente nacionais e internacionais ativos e uma patente concedida em Portugal. Uma das invenções está centrada na preservação de gâmetas masculinos e a outra, mais recente, permite sincronizar e ativar os espermatozoides para o processo de fecundação. Na vertente de aplicação humana a equipa de Marco Alves conta já com o importante apoio da gigante farmacêutica Merck e os próximos passos são arranjar parceiros estratégicos para a área veterinária e também para o desenvolvimento de novos métodos de seleção de gâmetas para a procriação medicamente assistida. Além disso, o investigador tenciona continuar a “demonstrar que o modo e o estilo de vida do pai podem influenciar a saúde dos filhos e dos netos”, conta Marco Alves.

Apesar de reconhecer o esforço da Universidade do Porto em apoiar os cientistas (é um investigador ativo nas iniciativas da U.Porto e participou, inclusivamente, no Business Ignition Programme, também organizado pela U.Porto Inovação), o investigador considera que existem ainda muitas falhas na interação com possíveis investidores. Na sua opinião Portugal ainda não tem uma “real cultura de mecenato e investimento em ciência”, mais ainda quando falamos deste tipo de áreas científicas nas quais os resultados demoram a aparecer o que cria a necessidade “de uma relação de grande confiança entre investigadores e investidores”. Para Marco Alves serão precisos muitos anos para que “não só na U.Porto como em Portugal se desenvolva uma relação forte entre academia e indústria” e, assim, a valorização do conhecimento tenha um real impacto para a sociedade e para as pessoas.